sábado, 28 de fevereiro de 2009

Reviver



Quando ela voltou a ter o mundo todo nas mãos, uma espécie de onda gigante voltou a destruir parte do que havia sido reconstruído.
No momento em que esboçou o seu primeiro sorriso, ele apareceu. Apareceu de uma forma tão violenta, tão forte e, ela, voou para os braços dele. Ele pegou na sua mão, agarrou o seu corpo, aproximando-o do seu, como se o mundo fosse acabar naquele instante, encostou os lábios no ouvido dela, sentindo-se a respiração quente e acelerada e, lentamente, os lábios aproximam-se, os corpos fundem-se.
A saudade morreu ali, morreu quando os olhos dele destruíram todas as tristezas.
Voltou a sorrir, voltou a viver, voltou a sonhar mas, apenas, durante aquelas horas, enquanto a onda voltava para o mar, até o sol deixar de brilhar.
Quando tudo isto passar, a nuvem voltará a cobrir todos os sorrisos e haverá outra tentativa de existência.
Ela sabe que é isto que acontece sempre, mas aquele buraco escuro tem tanta força e ela não consegue deixar de cair nele. Porque a saudade mata-a. Não, não fisicamente, mata a sua alma, mata todas as suas capacidades de sobreviver.
A onda voltou para o mar. Ficou escuro…

Realidade


Uma vez a Sara disse que haviam mil e um motivos para sorrirmos e que não vale de nada perdermos a nossa alma em momentos que agora não passam de meras recordações. Quando aquelas palavras se entranharam com toda a força no seu coração ela discordou, gritou com muita mágoa que ninguém a entendia, mas, a realidade não é essa, e a Sara tinha razão.
Com os phones nos ouvidos, um pequeno sorriso no rosto com uma força inexplicável que tomou o seu corpo, encontra-se num plano e fresco passeio junto ao rio.
Sentou-se num daqueles bancos de pedra, com um pequeno canteiro, repleto de flores com cores muito vivas, junto a ele. Tirou um pequeno caderno da sua mala e arrancou todas as folhas escritas e, lentamente, atirou-as, uma a uma, ao rio.
Agora, as recordações, pertenciam somente á sua alma; o passado, as ondas encarregaram-se de guardar.

Mudança


Em relação á saudade não há muito a dizer. Ela apenas constatou que magoa. Sente vontade de estar com ele, de o abraçar, de o beijar, de o sentir por perto. Mas agora, agora, não há volta a dar. Ele voou e ela, mais tarde ou mais cedo, fará o mesmo.
Sim, ele tirou-lhe a vida, tirou-lhe os sonhos, roubou-lhe as cores, mas, a determinação e a vontade de atravessar este caminho escuro continuam imunes a todas as adversidades.
Talvez haja uma transformação, uma mudança, um objectivo a alcançar e ela, agora, está disposta a correr até ele e a atravessar todos os obstáculos.
Parou, por um momento, de olhar para o vazio e agora fixou o olhar na tela que havia pintado com todas as cores possíveis, o gira-discos continua ligado e as lágrimas estancaram, esboça um leve sorriso, que soa melhor que uma pequena gargalhada.
Abriu, brutalmente, a janela, aquele ar quente invadiu o espaço, vestiu a sua roupa predilecta, bateu com a porta do quarto e saiu a correr, saiu em busca da sua felicidade.

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Inspiração


Agora o quarto não é mais que o seu refúgio, a sua protecção. É o local de inspiração, de purificação da alma. Que a faz sonhar com príncipes e princesas, com castelos e palácios, com coches e cavalos, com vestidos compridos, brilhantes, esbeltos, onde o príncipe encantado existe.
Ele tem tanto poder sobre ela, ele tem a capacidade de lhe tirar a vida, de lhe roubar a felicidade, de lhe apagar os sonhos. Sim, porque até agora, ela acreditava que se tornariam realidade, agora não passam de simples imaginação que se transformam em lágrimas.
Os raios de sol atravessam a janela fechada, o gira-discos está ligado, um som harmonioso, calmo, permanece naquele espaço tão vazio e as lágrimas caiem continuamente do seu rosto.


Lá fora já nada faz sentido, já não há uma força que a supera, já não há dois corpos fundidos num. Apenas vê a sombra escura, imóvel. Os ponteiros do relógio não avançam.
Pega, desenfreadamente, numa fotografia antiga, uma imagem que todos desejam, sorrisos que só no momento se entendem, estão lá reflectidos. Os olhos dela brilham…
Ainda hoje se questiona a definição da palavra “saudade”. Sim, porque todos sentem saudade. Mas o que é realmente? A Marlene diz que é sentir falta de alguém, diz que é sentir um vazio; a Tatiana diz que é sentir falta de algo ou de alguém importante. Mas se é apenas isso realmente, porque é que magoa tanto?

Experiências


Ema acorda, sai em silêncio, encosta a porta com todo o cuidado. Ouvem-se os cães a ladrar, as crianças a brincar, os pratos a bater e ela também acorda. Dirige-se ao espelho, passa as mãos no rosto, passa uma escova no cabelo e senta-se numa almofada perdida no exausto ambiente vivido naquele quarto. Ao lado havia um lápis e um papel em branco. Olha por entre a janela, outra lágrima preenche a sua face triste. Pega no lápis e no papel e escreve. Escreve tudo o que sonhara que acontecesse. As lágrimas caiem continuamente do seu rosto e ela escreve durante minutos, sem parar apenas um único momento. Tudo o que escreve é sentido; baseia-se no conhecimento através das impressões, porque ela cresceu muito com ele, aprendeu muito com ele!
Pára de escrever, atira com o lápis, sem que se perceba onde está ele agora. Lê tudo o que escrevera, e por entre aqueles soluços incontroláveis, esboça meros sorrisos. Agarra no papel e coloca-o dentro de uma caixa preta, repleta de fotografias, desenhos, de recordações. Recordação, sim, é este o motivo de sofrimento. Abraça uma almofada com toda a força e chora. Chora perdida na dor, na dor que a sufoca, que a não deixa pensar, que a não deixa lutar, que a não deixa viver. Os sonhos? Os sonhos agora eram folhas caídas de árvores debruçadas. Agora, agora não havia qualquer motivo que a fizesse sorrir, que a levasse ao auge da felicidade, que a completasse. Agora apenas existiam pedaços de si, pedaços espalhados por todos os momentos vividos com ele. E ele, ele era o portador de todos aqueles pedaços, dos quais ele também fazia parte. Ele era a peça mais importante, a que fazia girar o seu mundo, a que tornava os seus riscos em maravilhosos desenhos, a que juntava as palavras de forma tão profunda. Era ele a sua vida, ele era a sua música.
Torce a almofada tentando-a destruir, porque é essa a vontade que tem de fazer com a sua vida, mas perde as forças.
Levanta-se, pega num casaco escuro, com alguns riscos de tinta colorida, parece ser antigo; veste-o e agarra numa tela branca, nos pincéis e escolhe as cores para desenhar a sua vida.

Vivências


Voltou para trás, desorientada, coberta de lágrimas. Sentou-se no mesmo lugar, e tentou recordar tudo o que sentiu. A sua respiração estava acelerada como nunca antes esteve. Ficou ali durante horas a olhar a água, como se da primeira vez se tratasse. Nunca desejou aquilo, poderia ter continuado feliz com ele, mas ele preferiu ir embora e isso magoava-a, sentia um vazio tão profundo como se o mundo lhe caísse das mãos.
Entrou em casa desconsolada, todos lhe perguntavam o que acontecera, mas ninguém se dignou apenas a estar ao lado dela, ninguém compreendia aquela dor. Ouviu-se um barulho, talvez a porta do seu quarto a bater. Deitou-se por entre todas as almofadas que decoravam a cama e só se ouvia soluçar. Um silêncio profundo permanecia naquele quarto, estava escuro, as cortinas não deixavam a luz entrar, sentia-se um desconforto incrível, as pernas dela tremiam, as almofadas não deixam que se visse o seu rosto.
Começaram a ouvir-se passos por entre o corredor, e alguém tentava abrir a porta com muito cuidado. Ela ergueu a cabeça desejando que ele se tivesse arrependido e voltasse. Era Ema que, com passos suaves, dirigiu-se à sua cama, sentou-se ao seu lado, e passou-lhe a mão no rosto.
Ela voltou-se para o outro lado sem conseguir dizer apenas uma palavra. Ema pegou nas almofadas e colocou-as num canto do quarto, abriu as cortinas, a luz entrou, e deitou-se com ela na cama. Ficaram ali as duas e Ema disse num tom meigo: - És demasiado importante para te deixar sozinha neste momento. Dorme agora, descansa.
E ficaram as duas ali até o sol voltar a entrar por aquela janela.


Recordações


Os corpos imóveis, molhados, colados um no outro, com o forte desejo de nunca deixarem de sentir tudo aquilo; a ansiedade que se manifesta com vontade de revolucionar tudo o que está a acontecer; o corpo dele encostado no dela, gélido; o toque suave que a arrepia e o fechar dos olhos que a faz sonhar e viver no auge.
Ela acorda, sai em silêncio, deixa cair suavemente a manta sobre ele, sem que sinta o frio. Olha a paisagem, senta-se do lado direito da piscina tentando não se molhar. O sol e a aragem fresca fazem-se sentir no seu rosto. Brinca com a água e, no instante em que a última gota volta a cair, ele aparece. Os lábios dele parecem correr desenfreadamente em direcção aos dela. Ela fecha os olhos, a brisa parece ser cada vez mais fria, o sol mais quente ainda, e o sentimento parece aumentar a cada segundo.
Ele despede-se dizendo-lhe suavemente ao ouvido, por entre os cabelos, que a ama. Ela observa-o ao longe, sente uma lágrima no rosto, a imagem fica desfocada...